Certa vez lí num livro que o trabalho de parto é um ritual de passagem e, realmente concordo que essa é a melhor forma de descrever esse momento, tanto para a vida da mãe quanto para esse novo ser que vem chegando...
E o nosso ritual (meu e da Isa) começou ás 3h00 do dia 08 de janeiro de 2012, na primeira noite de uma linda lua cheia, que apesar do céu levemente encoberto, fez questão de se mostrar...
Nesse horário, ainda em casa, minha bolsa se rompeu... É incrível como dizem que, quando chegar o momento nós saberemos... e sabemos mesmo! Em meio a tantas contrações de treinamento, aquela foi diferente: ela anunciava o início do ritual!
Calmamente fui tomar um banho, acordar minha família e seguimos para a Casa de Parto de Sapopemba, que fica há uns 40 minutos de onde moro. Chegamos lá por volta das 4h00, fui examinada e só estava com 1cm de dilatação, logo de cara senti a ameaça da possibilidade de ter que ser encaminhada para o hospital da Vila Alpina... Fui orientada a caminhar para auxiliar na dilatação... Em meio à contrações que iam se intensificando a cada momento, fiquei curtindo a noite e ar fresco, observando as árvores e notando uma magia sobrenatural nelas. Esse foi o momento em que tive uma maior expansão da consciência, pois o nível da dor ainda me permitia isso. Foram diversas sensações e um contato espiritual muito intenso, uma abertura para o que estaria por vir. Nesse momento, só pensava na imagem de "Sheila na Gig" (não lembrava desse nome, claro), mas que é uma deusa da mitologia céltica e representa a "Abertura"... mais tarde fui entender melhor ainda o porque...
Após 4 horas, as dores das contrações me trouxeram para uma vibração mais terrena. Nesse momento estava com 4cm de dilatação, o que era pouco pelo tempo passado e por estar com a bolsa rota, por isso tive que tomar ocitocina sintética na veia, para aumentar as contrações, a dilatação e por consequência, as dores.
Daí em diante foram horas longas de passar, a maior parte do tempo fiquei sentada na bola em baixo do chuveiro com água quente escorrendo pelo corpo. Minha mãe que acompanhou todo o processo via em meu rosto a expressão do que estava sentindo e eu via nela sua aflição por pouco poder fazer para aliviar aquele momento.
Dentro de mim, algo dizia que era importante passar por essa dor, mas não sabia ao certo o que era, sei que por mais estranho que pareça, eu tinha vontade de passar por tudo isso. Depois de vivida a experiência e ainda sem entender bem, lí num livro algo que fez bastante sentido:
"Para se conectar com partes muito escondidas de nosso ser, para investigar bem lá dentro e sair do tempo e espaço reais. Para entrar em um nível de consciência intermediário, um pouco fora da realidade. A dor permite que nos desliguemos do mundo pensante, percamos o controle, esqueçamos a forma, o correto. A dor é nossa amiga, nos leva pela mão até um mundo sutil, ali onde o bebê reside e se conecta conosco. Perdemos a noção de tempo e espaço. Para entrar no túnel da ruptura, é indispensável abandonar mentalmente o mundo concreto. Porque parir é passar de um estágio a outro. É um rompimento espiritual. e, como todo rompimento, provoca dor. O parto não é uma enfermidade a ser curada. É uma passagem para outra dimensão." (A maternidade e o encontro com a própria sombra - Laura Gutman).
Passadas 12 horas desde que tudo começou, o intensamente esperado momento chegou. Eu já não sentia mais forças nessa hora e sentia que não ia conseguir, foi quando a enfermeira falou, sabiamente: "Todas as mulheres dizem a mesma coisa nessa hora". Incrivelmente aquela frase teve um efeito estonteante, como se eu me unisse a força de todas as mulheres do mundo. Foi exatamente assim que me senti, como todas as mulheres do mundo! Feliz, conectada com Gaia, mas mesmo assim, ainda com muita dor. Uma outra sábia frase permitiu a liberação desse novo Ser, essa vinda agora de minha mãe: "Vem Isadora, sabendo viver, aqui é um lugar muito bom!". Era o que faltava...
E lá estava ela, milha linda filha! Exatamente ás 15h06, pesando 3045kg e 47cm, eis que rompe:
Isadora, a dádiva da lua!
Que sensação maravilhosa! Com poucos segundos depois do parto já estava ela mamando com toda vontade, junto ao colo da mamãe...
Eu estava exausta, ali mesmo onde estava permaneci por mais 6 horas, quase sem conseguir me mexer. Somente bem mais tarde conseguir unir um pouco de força para tomar um banho, ouvindo o chamado lá do fundo de mim mesma que minha filha precisava se nutrir e que eu não iria falhar.
Momentos depois eu já tinha ela nos meus braços e confesso, não houve estranhamento nenhum, foi amor a primeira vista! Em pouco tempo já estava provando esse sentimento lindo que só quem é mãe sabe dizer...
Bem-vinda Isadora! É tudo nosso!